"E para fugir da solidão os homens se entregam de bom grado a relações confidenciais das quais em seguida se arrependem, mas que por certo tempo permitem-lhes ter a ilusão de que uma simples confidência já seria uma forma de amizade. Imagina-se - e meu pai ainda estava convencido disso - que a amizade é um serviço que se presta. Mas o amigo, assim como o apaixonado, não deve esperar uma recompensa para seus sentimentos. Não tem que exigir contrapartidas por seus serviços, não deve considerar que a pessoa eleita é uma criatura fantástica, deve conhecer seus defeitos e aceitá-la como é, com todas as consequências. Isso seria o ideal. E, de fato: será que vale a pena viver, ser homem, sem um ideal desses? E se um amigo nos decepciona porque não é um amigo de verdade, será que podemos acusá-lo, jogar-lhe na cara o seu caráter, a sua fraqueza? Quanto vale uma amizade que ambiciona ser premiada? Será que não temos o dever de aceitar o amigo infiel exatamente como o amigo fiel e cheio de abnegação? Será que não é talvez o conteúdo mais autêntico de toda relação humana, esse altruísmo que do outro nada exige e nada espera, absolutamente nada?"
(Sándor Márai - As Brasas)